segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Sobre Domenec Torrent


Cheguei onde queria. Falar sobre Domenec Torrent. E precisei respirar fundo e acalmar o coração rubro-negro, uma vez que escrevo esta coluna na manhã seguinte à goleada sofrida no jogo contra o Atlético-MG.

Vamos começar do princípio: Domenec Torrent chegou ao Flamengo depois que o Jorge Jesus decidiu retornar ao Benfica de Portugal. Não consigo imaginar outra razão para a saída do JJ que não tenha sido a pandemia descontrolada no país e ignorada pelo governo brasileiro. JJ já é um senhor de idade avançada, tem seus familiares longe, e sempre disseram que a maior dificuldade dele era ficar longe da família. Imagina isso num contexto de pandemia.

JJ saiu e a decisão foi dele. O que ele passa e o que acontece com ele lá em Portugal pouco importa para nós (rubro-negros) agora. O que precisamos entender antes de continuar é: Ele escolheu sair, mesmo tendo renovado o contrato. Ele escolheu sair, mesmo tendo tudo que pediu em termos de elenco. Ele escolheu sair, mesmo com todo o sucesso que teve por aqui. A escolha foi dele e ele não deve voltar (pelo menos por agora).

Com isso o Flamengo teve que começar a procurar um novo técnico em meio a pandemia de COVID-19, e tinha como objetivo continuar com um técnico estrangeiro, de preferência europeu. Porém, na época não havia muitos europeus com filosofia de jogo ofensivo que aceitariam vir para o Brasil sob o contexto que encontrávamos. Recebemos negativas de Leonardo Jardim, Carvalhal e outros. Dos que pareciam topar vir havia o Hierro (ex-técnico da seleção espanhola) e o Domenec Torrent (ex-técnico do New York City e ex-auxiliar de 10 anos do Guardiola).

Pareceu que o Flamengo ficou interessado na possibilidade de implantar a escola de jogo posicional que o Guardiola propõe nas equipes que treina, mas através de Domenec Torrent. Não é algo simples, mas acharam que com o elenco que o Flamengo tinha e com o trabalho que fora realizado pelo JJ seria uma adaptação rápida.

A metodologia do jogo posicional defendido por Guardiola e seus ex-auxiliares (Domenec e Arteta) não é algo simples. Na verdade foi revolucionário no futebol europeu e não é simples de se reproduzir, tanto que poucos conseguiram implantar com sucesso (exceto o próprio Guardiola, com auxílio dos dois ex-auxiliares à época).

A chegada de Domenec teve um impacto na torcida que começou a sonhar com o Fla jogando à Barcelona do Guardiola. Porém o início decepcionou e vimos um time que parecia imbatível cair por 2 vezes seguidas e em uma delas para um time que acabava de subir da Série B. Ali ficou claro, pelo menos para mim, que já não havia resquício daquele time treinado pelo Jorge Jesus.

Mas a culpa era do Domenec? Tinha chegado não havia uma semana completa. O que havia ocorrido então?

Simples. O Jorge Jesus era extremamente centralizador e não deixou nenhum legado técnico ou metodológico. Tudo veio com ele e tudo foi embora com ele. Então Domenec tinha que começar do zero.

Ah, mas o jogadores são os mesmos, era só perguntar a eles o que era feito!

Não é tão simples! Talvez para técnicos brasileiros isso funcione. O técnico chega, conversa com os jogadores e, se o trabalho anterior era bom, pergunta aos jogadores o que era feito para poder seguir fazendo. Mas em técnicos estrangeiros (sejam europeus, sul americanos, etc) isso não funciona assim. Não chegariam e perguntariam aos comandados como é que deveriam fazer seu trabalho. Isso demonstra, ao menos para eles (técnicos estrangeiros), falta de metodologia de trabalho, o que é grave no mercado lá fora. Uma coisa é chegar e encontrar uma metodologia implementada num clube e aos poucos ir adequando a sua, outra coisa é chegar e encontrar nada implementado e perguntar aos jogadores como é que era feito.

Em "terra arrasada" não se planta, é necessário adubar e preparar a terra para o plantio da nova cultura. Não há transição.

Não estou dizendo que o trabalho do JJ foi ruim, longe disso (foi excepcional), mas parece que ele nada deixou de legado metodológico e técnico.

Então o Domenec começou tentar implementar o trabalho do jogo posicional de início, confiando na capacidade adaptativa dos jogadores do Flamengo. Mas como o próprio livro do Guardiola diz, é como ensinar uma nova linguagem aos jogadores. Leva tempo até que estejam fluentes.

Então o Flamengo oscilou, e muito, no início. Então veio o 5 x 0 sofrido para o Independiente Del Vale (IDV). Causou muita estranheza o time jogar daquela forma, mesmo com altitude. Parecia o famoso "técnico que perdeu o elenco". Mas na sequência da semana começaram a aparecer os primeiros casos de COVID-19 no elenco, que culminou num verdadeiro surto de COVID-19 no Flamengo, pegando quase toda comissão técnica (acho que só o Pedro e o Thiago Maia se safaram, e os que já tinham tido).

Dentro desta realidade o Flamengo começou uma sequência de jogos insana em que até hoje não conseguiu reunir força máxima de sua equipe, com lesões, convocações, descobertas de bons valores na base. Jogadores contratados que não apresentaram condições técnicas de estar em campo, até mesmo jogo marcado apenas 48 horas depois do anterior. Mesmo assim o Flamengo ficou invicto por 12 partidas seguidas. Parecia que o vento tinha virado e o trabalho do Domenec podia começar a florecer.

No entanto, no décimo jogo após 28 dias, com uma média de um jogo a cada 2,8 dias, o Flamengo abriu a ferida da goleada sofrida em Quito. Flamengo enfrentava o São Paulo em casa e tomava 4 x 1. A defesa não funcionara por todo este período, porém não tinha sido colocada tanto a prova, pois no Campeonato Brasileiro somente 3 times tinham condições de explorar isso com muita qualidade (Internacional, São Paulo e Atlético-MG). E para o azar do Domenec, enfrentaria esses três times em sequência no Brasileirão (rodada 18, 19 e 20), com jogos da Copa do Brasil no meio delas (contra o já enfraquecido Athletico).

O resultado só não foi pior porque o Internacional tirou o pé em seu jogo, o que possibilitou o empate do Flamengo. Então tivemos 1 ponto somado em 9 possíveis com 10 gols sofridos e 3 feitos, saldo de 7 negativos. Desempenho muito abaixo da crítica.

E o pior, em nenhum deles o Domenec demonstrou entender ou saber resolver o problema da defesa. A torcida no Twitter (a famosa FlaTT) já comparava o trabalho dele com o do Abel, falando que os bons resultados eram exclusivamente por conta dos jogadores (o que não é verdade). Eu, particularmente, não vejo similaridade do trabalho do Abel com o do Domenec (o do Abel era pior), porém também não vejo similaridade com o trabalho do Jorge Jesus. Vejo o Domenec ter um trabalho muito similar ao do Fernando Diniz no São Paulo, porém com um ano de atraso. Um time que ataca e cria diversas situações de gols, mas se expõe muito! Deixa a defesa descoberta quase que o tempo todo, mas como enfrentamos em sua maioria times que criam pouco (os reativos) o Flamengo tomava muitos gols, mas fazia sempre mais. Ao enfrentar times que criam muito, o Flamengo sofreu com sua defesa exposta.

Houve falhas individuais? Houve, mas não foram só elas. A exposição da defesa facilitou as falhas individuais ocorrerem. Assim como os times do Diniz recebe essas críticas (como foi no Athletico, no Fluminense e agora no São Paulo). A diferença do time do Domenec para o time do Diniz é que o time cria e, em sua maioria das vezes, consegue fazer gols.

Neste momento a torcida do Flamengo não aceita mais a permanência do Domenec como técnico, é uma crise com o time na 3ª posição do campeonato atualmente (sei que pode e deve ser ultrapassado pelo São Paulo com 3 jogos a menos), nas quartas de final da Copa do Brasil e nas oitavas de final da Libertadores. Novos tempos no Flamengo.

Agora o que eu acho sobre tudo isso? Bem, demitir o Domenec (que sairia com sua comissão técnica) parece apenas uma questão de tempo. A grande dúvida é: trazer quem? E como já falou o amigo Fábio Justino no Twitter, essa é uma pergunta que não deve ser feita à torcida!

Então o que acho? Sei que dificilmente o Domenec conseguirá colher frutos em seu trabalho no Flamengo, também sei que dificilmente conseguiremos um técnico estrangeiro que queira vir neste momento (mesmo com o Flamengo com o elenco que tem). Trazer um brasileiro para comandar o Flamengo também não é muito atrativo, visto que o sarrafo está lá em cima e nenhum do brasileiros atualmente conseguirá manter o padrão de qualidade de atuação que a torcida quer (e não é só defensivo).

Ou seja, o Flamengo terá um resto de temporada de controle de danos. Demitir é a melhor opção? Realmente eu não sei. Sei que já passou da hora do Domenec mostrar serviço e arrumar a defesa, o time é desequilibrado. o fato é que ele não tem mais tempo para isso. Era para ontem e ele não mostrou até agora.

ATUALIZAÇÃO


Domenec Torrent não é mais o técnico do Flamengo.

Quem será o novo técnico do Flamengo? Por favor, que não seja o senhor Waldemar!


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